CLAREANDO

Juarez Machado de Farias

 

O galo madruga o canto,

Profetizando essa hora

A que chamamos aurora:

Ressuscita o sol de ontem,

Sorrindo lá no horizonte;

No garrão prateando a espora.

 

A calhandrita, em seu ninho

Armado nas laranjeiras,

Abrindo a alma altaneira,

Imitou aves irmãs,

Orquestrando estas manhãs,

Original e matreira!

 

Abriu-se a porteira grande

De todo o som, toda a cor:

Cada vivente é um cantor

E os que não cantam, murmuram

Silêncios que se procuram

Tais o espinilho e a flor.

 

Sabe o cachorro ovelheiro,

Depois que vigiou as sombras,

Contou estrelas em ronda,

Uivando pra madrugada,

Que se a zaina está pegada,

Haverá troteada longa.

 

Bate a porta da varanda

Na sua linguagem cortada,

Tendo a pele serenada

E a cada rigor mais nua.

Sai o campeiro pra rua

Montadito na alvorada!

 

Numa encerra de taquara

Com santa-fé no quinchado,

O coricó agoniado

E o reclame igual dos pintos.

De milho e sol são famintos,

De esgravatar no cercado.

 

Tanta coisa a gente lembra

E a tantas outras se assiste:

Na verdade, nada é triste

Além dos olhos de alguém.

Pode haver cinzas também

No maior clarão que existe.

 

E o violão da noite escura,

Quando fico milongueando,

Faz lembrar, de quando em quando,

O sol na boca da caixa,

Dando rédea pra luz guaxa

Quando o dia vem clareando!