PEALO DE CUCHARRA

José Machado Leal

 

O vento norte assobiava,

o dia era mormacento

e eu, que não gosto de vento,

levantei meio azedo

e louco por um enredo,

fui gritando c'o tostado,

que pateava atravessado

querendo negá o estrivo.

Qualquer mau jeito é motivo,

quanto o "santo" ta virado.

 

Nem aquentei a cambona

e não mais do que num upa,

fui à mala-de-garupa,

garrei a guampa de canha

e saí cheio de manha,

procurando a Josefina.

Não vê que a diaba da china

inventou de posar fora.

Gastei rosetas d'espora

no rastro dessa malina.

 

Fiquei que nem touro osco,

tranqueando de lombo duro,

na guampa não tenho furo

e sou índio meio touro

pra agüentar desaforo

por coisas do coração.

Se me criei como peão,

vivendo meio a trompaço,

não vou perder o compasso

por china sem compaixão.

 

Pois que se mande a la cria

e não volte mais ao ninho,

quem sempre viveu sozinho,

não estranha solidão

e potro que é redomão

não de doma c'o buçal,

quanto mais índio bagual,

caborteiro, pros arreios.

Pois ninguém me bota freio,

muito menos o bocal!

 

Mas o amor é como vício,

sempre enreda um cantor,

é igual ao cheiro da flor

que perfuma a solidão

e, por ter vivido em galpão,

tive tempo pra pensar...

-China com brilho no olhar

tem fogo no recavem,

não se amarram por ninguém,

vive sempre a procurar.

 

Vai daí, meu companheiro,

cada coisa em seu lugar.

Deixa o vento soprar

e a china c'o seu capricho.

Pra isso existe o bolicho,

tragos de canha, guitarra,

pois o amor é como farra,

ninguém gosta que se acabe

mas qualquer chinoca sabe,

quando o pealo e de cucharra.