VERSOS PARA RECORDAR

Jorge Lima

 

Um dia cantei um verso

Campeiro, bem a meu gosto

Pensei nos tempos de moço

Quando não tinha fronteiras

E minha alma galponeira

Tranqueou faceira no más

Volteando coisas que os anos

Foram deixando pra trás.

 

Recordei na voz da gaita

Um soluço de vanera

Quem sabe até uma rancheira

Dessas da moda véia

E dando rédeas pra idéia

Cruzou um costeiro tocando

O compasso fronteiriço

De um chamamé em contrabando.

 

Lembrei o galpão tranqüilo

Namorando a madrugada

O despertar da peonada

Que aos poucos vão acordando

A água pura esquentando

Pra um mate recém cevado

E um cusco lambendo as patas

Sobre a carona deitado.

 

Recordei a lida de campo

Marcação, domas e pealos

Vi tauras bem a cavalo

Pisar o chão da mangueira

A xucra escola campeira

Desta antiga profissão

Onde a indiada envida o laço

No duro ofício de peão.

 

Contei as baldas dos potros

E a coragem dos ventenas

Que faziam das chilenas

A companheira do mango    

Porque um flete corcoveando

Na mangueira ou campo a fora

Garantem vida a um ginete

Cordas trançadas e esporas.

 

Avistei os corredores

Bretes xucros do meu pago

Estrada dos índios vagos

De tropas e de tropeiros

Corredor dos carreteiros

Na sua lenta procissão

Levando junto a carreta

A alma do meu rincão.

 

Assim o verso e a alma

Guapeiam mais um janeiro

E o meu destino estradeiro

Volteia léguas no tempo

Atando com o mesmo tempo

O que o progresso esqueceu

Mostrando para os mais novos

Que a Tradição não morreu!