CAÇADOR

 João Alves Garcia

 

Sou um caçador de fama

Lá de São José do Ouro

Mato coruja de dia

Daquelas que faz agouro

Há pouco tempo matei

Somente com um estouro

Um lebrão de trinta quilos

Que ainda me resta o couro.

 

Eu não gosto de contar

Porque a indiada faz troça

Certa feita numa tarde

Quando eu vinha da roça

Liquidei um tatuzito

Da casca não muito grossa

Que arrastei como uma tora

Pois não coube na carroça.

 

Tiroudo bolso um espelho

Desses de china pelada;

Era noite enluarada,

Nem precisava de isqueiro;

Passou uma água de cheiro

No pescoço e no sovaco,

E pensou, hoje me atraco,

Como índio tarimbeiro.

 

Mas a desgraça é cosquenta

Pra um índio que tem zipela;

Logo em baixo da janela

Que o chinaredo proseava,

O Sidraquinho ajeitava

Seu cabelo mui contente

Quando repentinamente

Um grande banho tomava.

 

Logo viu que era urina

Pois sentiu na boca, o sal,

Relinchou como um bagual

Com a camisa ensopada;

-Quem foi essa desgraçada,

Que a bexiga não controla?

E arrancando da pistola

Atirou sem ver mais nada.

 

Gritou para o Nicanor,

Seu amigo mais chegado,

Mas o negrinho enfezado

Num namoro que tentava

Se ouvia, nem ligava,

Pros apelos do vivente;

Assim, mui tristemente,

Para o seu rancho rumava.

 

Era uma noite de agosto

Cobriu de neve a campanha

Por isso uma de canha

Golpeava a cada segundo,

Sua camisa “Volta ao Mundo”

Tremia junto com o couro;

Se o índio não fosse touro

Tornava-se um moribundo.

 

Com a cabeça mais tonta

Que gaúcho em discoteca

Puxou a bombacha sem cueca,

No estilo do bitico,

Seguia o índio nanico,

Mais ligeiro que uma bala,

Quando seu pescoço estala,

Na forquilha de um angico.

 

Seus urros foram tão fortes

Que deu para despertar

O velho parente Oscar,

Que chegou correndo tudo,

E retirou meio mudo

O gaúcho da desgraça,

O qual disse, na cachaça,

Eu não sou muito peitudo.

 

Pra levar o índio pro rancho

Riscado de bandonion,

Pulou dezoito sangões

Quinze valos e um poço,

Lhe doía, osso por osso,

Rangia os dentes de brabo,

E gritava;-Tem o diabo,

Nesses bailes do João Grosso.