PETIÇO BAIO

Jayme Caetano Braun

 

Meu pobre petiço baio

Trancho, lonanco e maceta,

Que ainda guarda na paleta

Tanto csinal de chilena

Hoje, ao te ver, com pena,

Solito, aqui neste fundo,

Sinto um desejo profundo

De ficar junto contigo

Pois foste o primeiro amigo

Deste andejo viramundo.

 

Foi sempre o maior anseio

Que tive em guri campeiro,

Antes de ser peão tropeiro,

Ter um cavalo, só meu,

E afinal, aconteceu,

Foste o meu pingo de marca.

Chô-égua, quanta fuzarca,

Nestes verdes desparelhos,

Pois contigo sob os joelhos

Eu me sentia um Monarca.

 

E mais adiante, recordo,

Quando fiquei mais taludo

Me acompanhavas em tudo

E até em tropas, te levei,

Petiço velho de lei

Que na enxurrada mais feia,

Bandeava uma sanga cheia,

Nadando que nem capincho,

E quebrou muito curincho

Em tiros de quadra e meia.

 

E ao te evocar retocando,

Entre a potrada da estância

Meu velho amigo de infância

Inda sem marca no lombo,

Lembro o meu primeiro tombo

Ali perto da mangueira,

Não rebentei a caveira

De piazito de campanha

Mas o que doeu na picanha

Foi ter plantado a figueira.

 

E os rodeios, que saudades,

Onde contigo, de em pelo,

Ia atacar o sinuelo

Pra não estorvar na lida.

Tu sempre de orelha erguida

Num sapateio fogoso,

E como eu ficava ansioso

Pra que alguém se descuidasse,

Pedindo que refugasse

Algum turuno teimoso.

 

E agora, venho encontrar-te,

Assim, vencido e sozinho,

A escorrer pelo focinho

Essa lágrima de adeus.

Meu petiço, Santo Deus,

Teu sentimento é de gente

Por isso é que reverente

Vou te encostando garrão,

Pois assim tenho a impressão

Que sou guri novamente.

 

Não é a morte, meu petiço,

Pra morrer todos nascemos.

O triste é quando morremos

Abandonados assim,

E se eu tiver igual fim

Nalgum perau da existência,

Tenham a santa paciência,

Na hora em que isso aconteça

Me ajeitem a cabeça

Na direção da querência.