GAÚCHO E COLONO

Jayme Caetano Braun

 

Mais de cem anos já faz

Que num arranco pujante

Chegou da Europa distante

Um vulto cheio de entono.

Que vinha também ser dono

Da nossa querência eterna

E o guasca boleava a perna

Pra receber o colono.

 

Desde então entreverados

Dentro dos mesmos cenários

Os dois vultos legendários

Do pago continentino

Entoaram o mesmo hino

De fulgente trajetória

E se embretaram na história

Traçando o mesmo destino!

 

E ao longo dos territórios

Que o gaúcho conquistava

Vinha o colono e plantava

Seus roçados e tapumes.

Copiou do guasca, os costumes,

As lendas e as diversões

E até mesmo as tradições,

Guardadas cheias de ciúmes!

 

E ao redor das sesmarias

Dos vales e dos penedos,

Foram surgindo os vinhedos

No maior desembaraço,

E a enxada, o machado de aço

Entravam na sintonia

Na mesma escala bravia

Da boleadeira e do laço.

 

Foi o toque generoso

Desse sangue de além-mar

Que veio fortificar

A raça, que então nascia.

Dando a têmpera bravia

Padrão de força e virtude

Dessa fusão semi-rude

Que despertou nossa cria!

 

Santo e bendito milagre

Caldeado ao frio do Minuano,

Filho do guasca pampeano,

Filho da Itália e Alemanha,

Entremeados na Campanha.

Tão gaúcho, um como o outro,

Tamanco  e bota-de-potro

Na valsa e na meia-canha.

 

Vejo um, riscando a fogo

Nossas fronteiras de guerra,

Outro falquejando a terra

Na cadência dos arados

E por fim, entrelaçados,

O cabo da enxada e a lança

Glorificando a pujança

Dos nossos antepassados!

 

Qual dos dois é mais gaúcho

Qual dos dois é mais Rio Grande?

Se o peito de ambos se expande

No mesmo sagrado anseio?

Já não é mais o que veio

Já não é mais o que havia,

Rio Grande, hoje, é a sintonia

Da lavoura e do rodeio.

 

Pois, se o guasca evoluiu.

Para chegar ao atual,

A velha fibra imortal

Pelas épocas perpassa.

E o Rio Grande se entrelaça

Nesses dois tentos torcidos

Que vieram, depois de unidos,

Formam o sovéu da raça.

 

Eu te bendigo colono

Desbravador primitivo,

Não como filho adotivo

Deste chão, santo e eterno,

Mas como anseio fraterno

Do velho pago bagual

Que em troca de amor filial

Te deu o amor paterno!


 

Por isso, como patrício

Riograndense, antes de tudo


Querido irmão, te saúdo

Corcoveando de emoção,

Pedaço do meu rincão

Que estreito um abraço forte,

Porque és também um suporte

Da gaúcha tradição.