GUILHERME COLLARES

PRANTO DO ARROIO À LAVADEIRA

Guilherme Collares


A correnteza é a lágrima

que choram, as pedras mouras

do porto das lavadeiras...

 

Murmuram, os salsos tristes,

os salmos de outras saudades

que, o tempo, fundiu ao pó...

Na branca espuma viajeira

foram levadas – pra sempre –

as penas da lavadeira...

...nessa constância do arroio,

de sempre andar e ser só...

 

Maria encontrou o arroio

desde muita tenra idade...

O arroio encontrou Maria

bem antes dela o achar...

...e uma vida companheira

de um encontrar-se no outro,

passou... sem ninguém notar...

Um em som e movimento...

...o outro em canto e lavar...

 

O arroio, como um amigo

que sabe escutar calado,

foi parceiro de alegrias...

...amparo nas agonias...

...fraterno pra todo mal...

Chorou junto com Maria,

levando soluço e lágrima

fundidos ao seu caudal...

 

E como um terno maestro

da orquestra da natureza,

que escreve as notas na pauta

de um pentagrama de areias,

também cantou com Maria...

...no vento que agita os salsos

...no doce bico dos pássaros...

...na estridência das cigarras...

...no entrechoque das cachoeiras...

 

E soube ser testemunha

do romance que nasceu,

quando Maria bateu

a vida na roupa suja

de um tal Maneco Rodrigues

- um domador de mão cheia! -

E o mesmo arroio andarilho

fez-se canção de ninar...

...e berço os galhos do salso...

...pra’os filhos da lavadeira...

 

E a vida – como o arroio –

no seu eterno passar...

...refletiu a espuma branca

dos cabelos de Maria

no leito claro do rio...

E um rosto – cheio de rugas –

adquiriu semelhança

à erosão das barrancas

castigadas pelo estio...

 

E quando um dia, Maria,

deixou de vir ao arroio,

manifestou-se a agonia,

de um sofrimento incontido,

de quem cansou de calar...

Nessa constância do arroio,

de sempre andar e ser só,

o arroio pede a palavra,

pois necessita falar:

 

-Onde andará a lavadeira

que, durante tanto tempo,

sofreu e cantou comigo?...

...lamenta, triste e soturno,

à suprema onipotência...

 

-Eu sou espelho de muitos,

mas os olhos de Maria

eram espelhos pra mim...

...se ela calava... eu calava...

...se cantava... eu respondia...

...por onde andarás, Maria,

que não te descubro o fim?...

 

O pobre salso –coitado-

por ter mais choro que o nome,

de tanto chorar, morreu!...

...resistiu a muita enchente e outras obras

do destino... mas, na perda de

Maria, também, ele, se perdeu...

 

-Por onde andarás, Maria,

que era tão triste como eu?

 

-Não levo mais tuas lágrimas,

fundidas ao meu caudal...

 

...não mais acompanho as notas

que soltavas, rumo ao pó...

 

...sigo, triste, este caminho

que me resguarda o destino...

 

...nesta constância de arroio,

de sempre andar... e ser só..