NUNCA MAIS

Cabeleira

 

Depois que deixei o campo

E me embretei na cidade

Esta malvada saudade

Nunca mais me abandonou

Vai junto pra onde eu vou

Machucando sem clemência

Eu sinto dentro do peito

Um tirão de vez em quando

Como um laço me puxando

Pra que eu volte pra querência.

 

Eu nunca mais fui o mesmo

Depois que vim do rincão.

Não tomei mais chimarrão

No galpão com a peonada.

A tropa passar na estrada

Também nunca mais eu vi

Sinto saudades dos campos

E do ranchito que eu morava

O riacho que eu pescava

No meu tempo de guri.

 

Nunca mais dancei fandango

Num rancho de cão batido.

Não escuto o alarido

Da peonada galponeira

Nem o ranger da porteira

Numa mangueira se abrindo

Quando lembro do meu pago

Eu fico horas pensando

Na minha mente enxergando

Do Rio Grande, surgindo.

 

Nunca mais tive alegria

Que lá na campanha eu tinha.

A querência que foi minha

Foi por mim abandonada.

Deixei a estância... a invernada,

Pela vida da cidade

As vezes grito...Por quê?

Que cometi esta loucura

São erros que a criatura

Comete na mocidade.

 

Nunca mais parei rodeio

Na coxilha verdejante

Hoje reponto por diante

A tropa do pensamento

Esperando algum momento

Que eu possa voltar de novo

Para rever os meus campos

Da minha terra querida

E o resto da minha vida

Viver junto do meu povo.

 

Caramba que china maula

É esta tal de lembrança.

Eu que fui desde criança

Taura, quebra de verdade,

Vim me embretar na cidade

Qual torito desgarrado

Na carreira da vida

Perdi o primeiro arremate

Dei paleta por empate

E pense que tinha ganhado.

 

Las pucha, como o destino,

Transforma a vida da gente.

Aqui tudo é diferente

Dos costumes da campanha

O povo não acompanha

As coisas da tradição,

Não vejo nas noites grandes

O piscar do vagalune

Nem sinto o mesmo perfume

Dos campos do meu rincão.

 

Chô Mico... Nunca fui destes,

De me entregar de primeira.

Filho de raça campeira

Criado sem ter patrono

Da minha vontade sou dono,

Fui assim desde guri

Qualquer dia saio a trote

Qual um gaudério sem rumo,

Chô Égua... Não me acostumo,

Com a vida que levo aqui.

 

O índio que nasce solto

Não pode aceitar maneia

Céu coração corcoveia

Num gesto desesperado.

Pedindo rédia ao passado

Que lá tão longe ficou

Eu vim pra cá de visita

Jamais pensei em ficar

Quando pensei em voltar

A vida não me deixou.


 

Eu não sou contra o progresso

Porque sei que é necessário

Não quero ser mercenário

Pois sempre fui patriota.

Mas quem nasce lá na grota

Sente saudade de tudo,

Fui guasca criado solto

De queixo erguido e altivo

Desses de sangue nativo

Morro de velho e não mudo.

 

E se um dia der de jeito

Quero sair deste brete.

Quero arrepiar o topete

Cortando léguas de chão

De volta pro meu rincão

Quero matar a saudade

E se isto acontecer

Eu campo á fora me solto

Lhes digo, “nunca mais volto

Presta vida da cidade”.