BORRACHO

Gonçalves Chaves Calixto (Cabeleira)

 

Parceiro... Repare bem...

Lá longe no infinito,

Bem ali tinha um ranchito

Onde morei certas eras

Hoje só restam taperas

Marcando o tempo buenacho,

E as lembranças que hoje tenho,

Daqueles tempos felizes

São profundas cicatrizes

Na alma deste borracho.

 

Há... se eu pudesse gritar

Pro mundo inteiro me ouvir...

Fazer o povo sentir

Aquilo que estou sentindo,

Este pampa que foi lindo,

Se a gente parar pra ver

Este Rio Grande glorioso

Que a tanto tempo eu defendo

Vai aos pouquitos morrendo,

Sem nada eu poder fazer.

 

Era tudo campo aberto,

Sem divisas... sem porteiras,

Uma pátria sem fronteiras,

Era assim, antigamente;

Não tinha cercas na frente...

Campos verdes...  céu azul...

Parecia qrá quem visse

Tão deslumbrante beleza,

Que a própria mãe natureza

Era o Rio Grande do Sul.

 

Foi então que o tempo “Maula

Foi chegando de mancito

E o meu Rio Grande bonito

Foi aos poucos se entregando,

Foi mudando... Foi mudando...

Até ficar diferente

O progresso, a galopito,

Sem ter do pago clemência,

Veio invadindo a querência,

Mudando a vida da gente.

 

Bem ali, naqueles montes,

Atrás daquelas coxilhas,

Morava o Juca Padilha,

Índio taura, guapo e Bueno

Que viveu desde pequeno

No ranchito... que era ali

De repente veio uns tauras

Pra construir uma estrada

Bem no meio da morada

E o Juca se foi daqui.

 

E assim foi outro...e mais outro...

As cercas foram surgindo,

Novas estradas se abrindo

Cruzando montes e sangas,

O velho pé de pitangas

Que tinha ali no varzeão

Que tantos e tantos anos

Deu a tão gostosa fruta...

Foi jogado, á força bruta,

De galho e tronco no chão.

 

Do campo verde de outrora,

Tão verde quanto á esperança,

Hoje só resta a lembrança,

Também do velho riacho

E o banhadão lá de baixo

Também desapareceu...

Foi transformado em lavouras,

Palmo a palmo foi lavrado

Muito pouco vê-se o gado

Neste campo que foi seu.

 

E eu que vi tudo isso

Ser aos poucos transformado;

O campo virar povoado

E o corredor com asfalto

Então eu grito mais alto

Peço socorro a campanha,

Só o vento Norte responde

Como quem diz... não adianta;

E eu volto a encher a garganta

Com mais um trago de canha.

 

Porém, ainda me resta,

Neste grito uma esperança,

Volta Sepé...Pega a lança,

Solta teu grito de guerra,

Torna a defender a terra

Nem que tu morra outra vez...

Chama de novo teus bravos,

Tua tribo missioneira

Derruba cerca e porteira

Como outrora tu já fez.

 

Levanta Bento Gonçalves,

Que o pampa está te chamando

Precisamos de um comando

Para dar esta arrancada,

Volta empunha tua espada

No pampa meridional...

Eu quero marchar contigo

Como um valente soldado

Galoparei lado a lado

Com você meu General.

 

E assim unidos faremos

O mundo nos compreender,

Quem quiser entender

Que amar o pampa é preciso

Nós daremos um aviso

Para que do pago se mande

Quem não gostar desta terra

Que tenha santa paciência

Suma de vez da querência,

Nunca mais volte ao Rio Grande!