Por Essas Lidas de Campo

Érico Rodrigo Padilha

 

Madrugada na campanha.

O canto do batará

Como um clarim de combate,

Denunciando a madrugada

No seu ritual de costume,

Se perdeu pelas canhadas,

E veio bater no rancho

Me despertando do sono.

 

Pra o peão aqui da estância,

O dia começa cedo,

Pois nem bem o galo canta

e o “índio” já se levanta

para empeçar a jornada.

 

Campos cobertos de geada

Desde a várzea ate a coxilha,

Lá fora o baio relincha

Bufando na estrebaria,

O sol, por Bueno irradia,

E mete a cara na estrada,

Convidando a gauchada

Pras lidas do dia-a-dia.

 

Começa  a faina campeira

pra os peões aqui do pago,

Serafin, encilha o mouro

na escolta do seu “pestiado”,

sai ao tranco pela estrada

pra o rumo da plantação,

é que andou fazendo “ceva”,

pra uma lebrezita esperta

que faz ronda e folga “a-toa

na lavoura do patrão.

 

Zé bugre, índio mestiço,

Também cruza de a cavalo,

Traz no cabresto um gateado

Já quase bom pra o serviço.

Vem tranqüilo, vem sereno,

Com seu jeitão entonado,

Fez na doma seu ofício,

Desse ofício, fez um vicio

E nunca brinca em serviço

No lombo de um aporreado.

 

Seu Bento, passa arrepiado

pra os lados da cerrilhada

sai no encalço de um novilho

que desgarrou da invernada,

agarradito ao ruano,

umbicho-de-unha”pra lida,

faz valer seu doze braças

que traz atado ao lombilho,

um “tiro seco”e certeiro

e vem na corda o novilho.

 

Sentado embaixo do umbu,

Preparando um bucal novo

Para quebrar o retovo

de algum malino na estância,

ao encurtar a distância

avisto um velho campeiro,

negro guapo, bom guasqueiro,

que tem a alma trançada,

e traz a estampa judiada,

sovada de lonca e pêlo.

 

Reponto xucros e alçados

Pela invernada do fundo,

Faço dos campos meu mundo

E da lida meu sustento

Na volta eu encontro alento

Porque a morena me espera,

Na entrada da primavera,

Deve chegar meu piazito,

Para alegrar o ranchito

Onde vivo ao lado dela.

 

As horas passam voando

E a lida bruta prossegue,

Não há um que não se apegue

A esses bens da natureza,

Por isso tenho certeza,

e afirmo neste meu canto,

e senhores, lhes garanto,

não há um que não se renda,

ao sorriso de uma prenda,

ou pelas lidas de campo.

 

E quando o dia se finda,

e o cansaço toma conta,

a peonada se reúne,

para prosear no galpão,

um chimarrão bem cevado,

e uma costela de ovelha,

salgando as brasas vermelhas,

de um fogo de chão campeiro,

pra quem lida o dia inteiro,

se torna uma obrigação.

 

Oiga-lê vida buena

pra quem habita na estância,

se renovam as esperanças

quando o dia assim se encerra,

o amor ao pago e a terra

faz tudo valer a pena,

a vida se faz serena,

por ser simples e sem luxo,

o orgulho de ser gaúcho,

aumenta a cada instante,

uma alegria se expande

e toma conta do ambiente,

que abriga toda essa gente,

que traz na alma o Rio Grande.