QUANDO AS ESPORAS SE CALAM

Élson Lemos

 


Não se ouviu hoje cedo na mangueira,

o arrastar das esporas

nem bufos de redomões,

um palanque solitário

no mais profundo silêncio...

braço erguido num adeus...

Dom Ricardo já se foi..

.prá matear noutros galpões.

 

O que se passou ninguém sabe,

um domador veterano,

calejado pelos anos

da lida bruta com potros,

se perder numa rodada?

Ironia do destino,

que dispara em desabrida

aquele que domou potros

 das tropilhas mais “veiacas

perdeu as rédeas da vida

no lombo da “colorada”.

 

Voltou solita a “crioula”

com uma rédea atorada

e o medo que dona Alzira

alimentara tantos anos

terminou por ser verdade,

viu ao longe o cusco baio

parceiro de dom Ricardo,

e um corpo, estendido ao chão

duro golpe do destino...

...traiçoeiro e redomão.

 

O tempo que tudo esquece

e cura tantas feridas

de tropear alentos

pr’aqueles que conviveram

com a lendária figura

que muitos touros dobrou

madrugando primaveras

e na arte de amansar feras

levou rodadas e pealos,

de potros fez bons cavalos...

...por domados, os entregou.

 

Agora resta o silêncio

num rancho pobre da estância

não se ouve chiar a cambona

prenunciando um mate novo

o velho basto e a carona

que encilharam tantos xucros

hoje encilham um cavalete

esquecido, abandonado...

...resta um laço enrodilhado

aos pés deste cavalete,

muitos potros sem ginete

pastando pelos potreiros

e um cusco companheiro

com o olhar triste na estrada...

... a espera de um amigo.

 

Meu pensamento vai longe...

e vem repassando imagens

prá enfrenar esta homenagem

a este maestro dos bastos,

quero crer que lá no céu

se houver mesmo vida eterna

ele anda alçando a perna em

muito potro veiaco”.

 

Sobra um verso aporreado na

 tropilha das lembranças

prá amadrinhar sentimentos...

Que vai galopeando ao vento

 repontando a solidão...

...saudades de quem ficou

e um par de esporas caladas

estrelas nas madrugadas

pelo céu de algum galpão!!!