O FILHO DA LAVADEIRA

Dimas Costa

 

Velho arroio de arrabalde,

espelho de águas calmas,

onde juntavam-se as almas

de tantas mães deste mundo.

Mulheres pretas e brancas,

tagarelando, lavando,

enquanto que perto, espiando,

um piazote vagabundo.

 

Era eu, que bem criança,

o sol da vida bebia.

E na doce sinfonia,

da charla das lavadeiras,

achava que a vida toda

era um lindo festival,

e as roupas sobre o varal,

as coloridas bandeiras.

 

Plaft! Plaft! Sobre a tábua,

batendo a roupa encardida!

Plaft! Plaft! E a mão ferida

não suporta o sabão.

Plaft! Plaft! Sobre a tábua,

batendo a roupa encardida

enquanto a mágoa da vida

encardia o coração.

 

Tagarelando, as mulheres,

batem a roupa na madeira.

Plaft! Plaft! E  outra bandeira

que subia para o céu.

E pela margem da grama

ficava, todo franjado,

de alvo lençol prateado,

um enorme e branco véu.

 

E por entre aquela brancura,

a brancura de uma alma,

tão meiga, pura e tão calma,

imagem do bem querer.

Minha mãe, a lavadeira,

que lavava o meu caminho

pra que eu tivesse, sozinho,

sempre limpo o meu viver.

 

Plaft! Plaft! Sobre a tábua,

batendo a roupa encardida.

Plaft! Plaft! E a mão ferida

não suporta o sabão.

Plaft! Plaft! Sobre a tábua

batendo a roupa encardida

enquanto a mágoa da vida

encardia o coração.

 

Que lindo mamãe lavava,

batendo a roupa com jeito.

E na inocência do peito,

meu coração sempre achava,

que entre todas as lavadeiras

igual a mamãe não tinha,

e era muito mais limpinha

a roupa que ela lavava.

 

Um dia – não sei porque-

a vida tudo mudou,

o festival terminou,

arrearam todas as bandeiras.

Foi salpicada de lama

a brancura do lençol,

da vida apagou-se o sol,

sumiram-se as lavadeiras

 

Minha mãe... levou-a o tempo!

E eu segui pela existência,

ouvindo sempre a cadência

de um coração que dizia;

A vida é linda... avante.

Mas não te iludas, meu filho,

que da alma o próprio brilho

pode encardir, algum dia.

 

E cheguei ao por do sol

desiludido do mundo.

E com o pesar mais profundo

eu ouço, sem ilusão,

O plaft! Plaft! no peito,

batendo a alma ferida,

porque a descrença da vida

encardiu meu coração.