ESPORA DA SAUDADE

Derly Silva

 

O pingo do pensamento

Galopava no horizonte

Saltando cercas e montes

Rumo a invernada do além

Talvez procurando alguém

Que a muito tempo partiu

Deixando um rancho vazio

E quem tanto a queria bem.

 

Era, a dona, só ela

Daquele rancho modesto

Meu Deus, não é protesto,

Mas que mal será que fiz

Para ser tão infeliz

Pois eu sem ela, bom pai,

Sou folha seca que cai

Sou um tronco sem raiz.

 

Meu rancho virou tapera

Desilusão, abandono,

Fiel retrato do sono

Sem a dona, sem carinho,

Acabrunhado sozinho

Já não sou mais quem eu era

Eu também virei tapera

Do jeito do meu ranchinho.

 

O jardim em frente ao rancho

De a muito não mais existe

As flores ficaram tristes

Foi morrendo tudo assim

O cravo, a rosa, o jasmim,

Folha verde ficou amarela

Só a grande saudade dela

Que brotou dentro de mim.

 

Até o casal de quero-quero

Que guardava nossa morada

Não grita de madrugada

Como outrora fazia

Já não é mais o vigia

Que estava sempre alerta

Pois quando a saudade aperta

Fica a invernada vazia.

 

Meu pingo solto das patas

Nunca mais ganhou carreira

E era pingo de primeira

Passeando em roda da estaca

Um zaino, anca de vaca,

Que de presente ganhei

Em cujas patas recheei

Muitas vezes, minha guaiaca.

 

A morte, pealo certeiro,

Vem quando menos se espera

Leva quem mais se venera

Pros pagos da eternidade

Sem ter, da gente, piedade

Só deixa recordações

E marca nos corações

Da espora da saudade.