FERRO BRANCO

Cyro Gavião

 

Dois índios queixo-duro, guampa-torta,

Se embretaram na querença duma china...

E se toparam, no rancho, certo dia:

Um que chegava,...e outro que saia.

 

João Manoel, que chegava, vendo o outro,

Um índio guapo, domador de potro,

Enveredou, “no más”, direito à porta.

Dum mangaço, deixou de cara torta

A china qu’inda vinha sonolenta...

Virgem do céu!... depois, uma tormenta

De trovoadas se ouviu, que parecia

Que se forjava, numa ferraria,

O aço da vergonha que se agüenta.

 

Mandico, o domador, pregou-lhe o grito,

Mandando o ferro, assim, meio “desgueio”,

Que racharia o outro pelo meio,

Não fosse ele um João Manoel de Brito.

 

Peleando, assim, desceram a canhada,

Respondendo chifrada por chifrada,

Num duelo de guapos, muito igual...

Mandico carregou...E, num pontaço,

Devolveu a afronta do laçaço,

Ferindo João Manoel,... muito mal.

 

O sangue, então, já lhe aflorava ao peito

E a luta parecia já no fim...

Mas, cabra macho não se entrega assim,

Porque, no sangue, traz a valentia.

Joga-se todo, numa só parada,

Pra que não digam, depois, entre a peonada,

Que fora maula, covarde e sem valia.

 

A visão turva, o sangue já na boca,

Atropelou, contudo, frente a frente,

Mostrando que, de fato, era valente...

Mandico já recuava... E, por caipora,

Enredou, na bombacha, a própria espora,

Caindo frente a ele que, na carga,

Pra cobrar a traição dura e amarga,

Varou-lhe o peito, num golpe, fora a fora.

 

Já cambaleava João Manoel de Brito,

Mas, ao cair, inda bombeou pra o rancho...

Vendo o pingo relinchar de cola atada

E a maula qu’inda espiava da ramada,

Cravou, no chão, a “daga”, até o esse,

Como se assim, morrendo, inda quizesse

Cravar na china aquela punhalada.