ERA UM GOVÊRNO

Cyro Gavião

 

Nos velhos tempos da infância,

Era relíquia da estância

Um pingo rosilho-mouro.

Era um cavalo de estouro,

Crioulo mesmo de lá...

nem sei porque será,

Que, ao relembrar, sempre o vejo,

Naquele triste cortejo

Das cousas velhas do pago...

 

Cada saudade é um afago,

Que traz um gosto de beijo.

 

Orelha ponta de lança,

Tinha marca de balança,

Que já vinha de família.

Não conhecia novilha,

Que lhe pisasse na frente.

Era um cavalo valente;

Sozinho cinchava um laço...

 

Cada saudade é um guascaço,

Que a sorte dá de presente.

 

Esse pingo anca de vaca,

Era uma chaira, uma faca

Pra trabalhar num rodeio.

Era buenaço de freio

E bom amadrinhador...

 

Cada saudade é uma dor,

Que racha a gente no meio.

 

Ninguém lhe punha os arreios,

A não ser meu velho pai.

Mas, esse tempo já vai

Morrendo no esquecimento...

Recordar é sofrimento

E vai matando a esperança...

 

Cada saudade é um agouro,

Porque nos traz à lembrança

Um pingo rosilho-mouro.