CORREDOR

Cyro Gavião

Corredor de mil canhadas,

Que leva a mágoa que eu trago;

Que arrima, de pago em pago,

Velhos fogões da querência.

Corredor...pura inclemência;

Estrada sem esperança,

Comprida, mas que não cansa

Porque eu tropeio a existência.

 

Estrada que serpenteia,

Traçando rumos no chão;

Corredor do meu rincão,

Da sanga feia e bolicho,

Ao te lembrar, eu capricho,

Sacrificando a memória;

És mais um tento da história,

Que, descarnado, eu espicho.

 

Corredor, olha a porteira,

Que dobra pra o lado esquerdo:

Naquele velho arvoredo,

Onde o chão está pelado,

Vejo meu pingo amarrado,

Num domingo de carreira

E a china alegre e faceira,

Que se acostava a meu lado.

 

Oh! Velha estrada real,

Grosseira e sem complacência,

Que atolava a diligência

Da filha do fazendeiro...

Até relembro o boleeiro...

A castigar os cavalos

Para arrancar dos teus valos

Aquele encargo folheiro.

 

Quanta carreira ganhei,

Na tua estrada batida;

Quanta noite mal dormida,

Num pouso de carreteiro...

Ou, então, mui prazenteiro,

Na culatra duma tropa.

Quanta roupa a gente ensopa,

Debaixo dum aguaceiro.

 

As sortes são diferentes,

Embora viajando perto:

Tu levas destino certo,

No destino vou atrelado...

Já me tenho rebelado

E, por ser pescoceador,

As voltas do maneador

Já me deixaram marcado.

 

Corredor, estrada certa,

Que nunca levou perdida.

Na estrada da minha vida,

Quantas guinadas já dei...

Pedi a Deus já implorei

Pra que evitasse um estouro

Da tropa que ao matadouro

Por que reponto, nem sei.