A VOLTA DO ZÉ DA PINHA

Cristiano Ferreira

Intérprete: José Cláudio Pereira

Amadrinhador: Cláudio Silveira

Poema participante da 12ª Sesmaria da Poesia Gaúcha

 

Não!...

Não ficou tapera a fazenda antiga!

 

Arrendou os campos,

encilhou o flete

-poncho emalado,

manoteou nos peçuelos –

ganhou a estrada

rumo à ilusão urbanizada,

sina brasina dos campeiros

deixados à própria sorte.

 

Sim...

Antes de montar,

recorreu a casa, o galpão,

a velha e buena mangueira de pedras,

parou à sombra da figueira

- de chimarrear ao entardecer –

pitando o último “baio”

para dar rédeas à saudade!

 

Fitou...

Ainda pitando,

o palanque de corunilha,

que, ante o tempo, não cimbrou,

como... querendo ter a mesma fibra.

 

E, quando...

Já na partida,

o berro do touro, por trás da coxilha,

o relincho do potro, repechando no cerrito,

ecoaram em seus ouvidos num sonoro:

- “Adeus, parceiro!”.

seus olhos deram vazão às gotas

de um orvalho de sentimentos,

naquela manhã de sol,

sobre o alvorecer tordilho de geada!...

 

Não!

Não deixou tapera a antiga fazenda,

um outro chegou “às casas”!

Na cidade...

Somente de changas

- mais os cobres do arrendamento –

sustentava-se, a esposa,

e ao colégio dos piás.

Passaram-se floridas primaveras

após sebrunos invernos

e, a cada dia vencido,

contava mais uma rês

no rodeio das brasinas!

 

Os dias foram passando

e, as noites, foram pequenas...

até que o relincho do flete tordilho-negro

(que lhe agrada o pêlo),

como “invite” de “Se bâmo”,

sinalizou que o campeiro

“virava a cabeça pro pago!...”.

 

Então...

como não há mal que sempre dure

nem dia que não chegue...

manoteou, novamente, nos peçuelos

- poncho emalado – ganhou a estrada,

a tropear suas lembranças

entre a poeira dos anos.

 

Ao tranquito,

Foi vencendo distâncias, costeando cercas

- arames... tramas... moirões...

cordas, trastes e cavaletes –

guitarra guapa dos ventos!...

 

Sempre...

Sentia que os antigos

- aqueles que portavam copos de guampas

com bocais de prata,

da voz amiga, conselho bueno

(os quais o Patrão Velho

reculutou pra Estância Grande) –

amadrinhavam-lhe os passos.

 

Chegando...

Ainda longito, avista a roda da carreta que

- escorada à parede secular –

orna o pitoresco quadro pampeano.

O coração corcoveia! (saudade da carreta)...

boi Neblina, boi Sereno,

parceiros de tempo e lida...

De relancina,

nota que tombaram os cinamomos

que havia junto à porteira,

tombou, também, a figueira, mas,

lá está ele – o palanque –

razão de suportar a distância

- parceiros de resistência,

a cabrestear o destino!

 

Não!...

Nunca esteve tapera a fazenda antiga!

Até por que...

a alma desse campeiro

sempre se fez presente,

no galpão, na sombra da figueira,

no lombo xucro dos potros...

 

O taura...

seu jeito humilde,

calmo qual água de cacimba,

com o coração – grande invernada –

emocionado,

transpôs a cancela e,

os barreiros, tajãs, seriemas,

os alvissareiros quero-queros,

impeçaram o alvoroço,

repercutindo a notícia

às coxilhas, às águas puras da sanga,

como dizendo:

- “Indiada, o Zé da Pinha... voltou”!