METAMORFOSE

Colmar Duarte

 


Que ele era uma alma boa

tudo pago já sabia.

 

O ser bom depois que morre

nunca foi um privilégio.

Mas este, enquanto vivia

soubera gastar seu tempo

como árvore,

que floresce e frutifica serena,

consciente

que a mesma geada

que lhe branqueiam as melenas

adoça o fruto maduro

e purifica a semente.

 

O campo

foi universo de uma etapa que findou.

Mesmo sem querer

andou como quem sabe que passa

na transição das tropeadas,

com repontes e pousadas

num rumo que não acaba.

 

Dizem que a morte

é o nada.

Mas pode ser nada a vida

se não se encontrar sentido

entre a chegada

e a partida.

 

Por isso seu desapego

às coisas que já tivera.

Fez rancho e arou a terra,

não como dono e senhor,

mas como quem – de passada –

a ocupasse neste mundo

por uma razão maior.

 

E quando emalou o poncho

não deixou conta a pagar.

Por onde andou crescem plantas

e há pássaros a emplumar;

No balanço das taquaras

brinca o vento alegremente

os espinilhos florescem

sobre arroios de águas claras

e a cigarra afia o canto

no esmeril do sol quente.

 

Enfim a serenidade.

Enfim o intemporal.

Andará sem pressa ou rumo,

campereando alguma várzea

- em manhãs de eterna chama –

em outonos sem final.

 

Livre agora dos temores

que vivem com os mortais,

tem a paz da borboleta

que vaga sobre os trevais.

Depois de haver sido larva

e pelo chão se arrastar;

Depois de ir

terra adentro

para, de treva e silêncio,

fazer asas e voar.