DE COSTAS

Carlos Omar Villela Gomes


De costas, fora de pulha, é assim que vejo o mundo...
É assim que vejo os dias que passam ao meu redor,
Contemplo o chão, deixo as casas, reviro a alma nas brasas
E bato meu par de asas pra revoar da razão.

De frente vejo um espelho, talvez um pouco quebrado,
Mas ainda assim um espelho que mostra o mundo lá atrás;
Fiquei com pena do mundo, rezei muito, até chorei,
Mas talvez não faça jus ao pranto que eu derrubei.

De costas, fora de pulha, é assim que o mundo me vê...
Virou de costas enfim... Talvez por ter visto em mim
Um
olhar de quem não crê.
Eu creio no mundo sim, mas não num mundo chinfrim
Que não tem nada a dizer.
Eu quero meu mundo assim:
Dizendo não pra o ruim
E o sim pra quem merecer.

O meu espelho retoca suas cores e impressões...
Nem parece o mesmo mundo sem caminhos nem paixões;
É um mundo redesenhado, o espelho mostra seus traços,
Onde a maior das adagas é bem menor que um abraço.

De costas, fora de pulha, é assim que fixo imagens,
Não confundam minha postura com ausência de coragem;
Fico de costas pra o mundo com forte convicção
Que ele pode, num segundo, me golpear à traição.

Tem um rio de inquietudes que me inunda cada artéria,
Que transpira pelos poros e transborda nas idéias;
Não viro as costas pra o mundo por desdém ou por castigo,
Mas pela dor sobre-humana de quem, após muitos anos,
Olhando nos mesmos olhos, não mais conhece um amigo.

De costas, fora de pulha, o mundo às vezes rezinga
E desabafa pra mim...
Reclama do meu motim, do meu bafo de cachaça,
De ter trocado a bombacha por uma calça de brim.
Se sou gaúcho de fato ou gaúcho de festim.

O mundo às vezes rezinga e desabafa pra mim.

Neste exato momento dou a volta no meu eixo
E encaro o mundo de frente.
O mundo já se virou...

Foi ele que quis assim, foi ele que quis pelear;
Não se duvida de um homem que planta sonhos em si...
Ainda tenho a mesma alma, a mesma fé em meu olhar.
Mesmo sabendo de sobra que luta pode ser fim,
O mundo desenha raios de ferro branco no ar!

Mas a força de um abraço mostra que o gume do aço
Desta vez não tem lugar.
Não preciso de astrolábios pra me situar neste céu,
Não preciso de desculpas pra ter perdão e perdoar.

De trás de todo o furor surgiu um raio de amor
Que iluminou seu olhar...
Reencontrei meu amigo!
Meu velho mundo perdido em algum tempo ou lugar
Muito mais do que esquecido.
A fé botou falta-envido nas cartas do que será!

De frente, é assim que vejo o mundo!
Já sem espelhos, sem pulhas, sem mágoa nem pequenez...
De frente, olhar de amigo... É assim que o mundo me vê!