Romance do Gaúcho Velho Solito
Aureliano de Figueiredo Pinto
dedicado, pelo autor, a Eurípedes Jobim de Oliveira

Quando arranchei neste chão
empecei pelas mangueiras
com essas tronqueras que aí 'stão.
- Já mudei muitas madeiras
mas são as mesm'as tronqueras
que do tempo aguentando vão.

Quando a maior ficou pronta
veio um barrero mui ancho,
e empeçou a erguer seu rancho
de uma tronquera na ponta.

Chegou ... Gostou do lugar.
Deixou de ser cruzador.
E, como eu, pegou na lida,
cada um cuidando sua vida
nenhum pedindo favor.
Porque êste rincão convida
para ficar morador.

Eu e êle, dois viventes,
dois tentos da mesma trama.
Eu com os braços, êle com as asas,
cada um barreando a sua casa
tudo a capricho e de fama
nesta chapada campera.
A dêle - lá na tronquera !
A minha - em riba da grama.

Êle cantava em sobrado,
fachudo moço bonito
mudando pena em agôsto.
Eu ... chimarreava com gôsto
meu mate de índio solito.

Outubro chegou, trazendo
promessas de nova era.
Êle avoou longe ... E, na vinda,
trouxe uma amiga tão linda
dourada de primavera.

É bicho invejoso o homem!
No redomão Polvadera
me fui ... ! galope ... teatino ...
aventurando o destino
para campear companhera.

Achei... Trouxe ela ... E empecei
a aquerenciar minha flor,
linda triguera paisana.
Mas no olhar de ressolana
tinha algo que não engana
o tino de um domador ...

O barrento amoroso,
clareando o dia em verão
abria o bico e cantava.
Eu com a prenda chimarreava
sôbre o recosto do oitão.

Domei ... Tropiei ... Plantei muito...
Juntei plata, ... Mas despois ...
Cheguei de viage ... Era um frio !
E achei o rancho vazio!
O rancho que eu fiz pra dois ...

E o que eu passei... Ninguém viu!
No pobre rancho vazio!
No rancho que eu fiz pra dois ...

E o par de barreros?... Lindo!
Quanto mais o tempo andava
mais amizade sem fim!
Um do outro não se esquecia.
Se não cantavam, se via
que era por pena de mim!

Segui mateando solito!
Quis tanto bem ... mal me quis !

E irei pensando até à morte:
- Por que é que eu não tive a sorte
do barrento feliz?! ...