CAMBOATAN FARRAPO

                           Aureliano de Figueiredo Pinto

 


 

Escuro, enorme, ornamental na tarde.

Plantado neste plaino entre coxilhas

é um velame da nau contra o horizonte

no mar alto dos campos.

 

E é linda a história da árvore solita.

 

Dois moços farrapos, cortando quebradas,

chegaram à estância, no alto,

para saber notícias.

E um deles,

que levava o coração cantando nas

guerrilhas

olhava nos olhos a neta bonita

cevando os amargos

junto a avozinha murcha

com mapas no rosto e lonjuras na voz.

 

E já os legais se vieram...

 

Começou a caçada, a guerrilha, o fratricídio

implacável, feroz.

E o mais jovem farrapo,

o que levava o coração cantando nas guerrilhas

sentiu no lance trágico

o redomão boleado.

 

Tiniram, retiniram muitos ferros brancos!

E uma vez, entre tantas, a tricolor bravia

estendida no chão:

- Ouros de ocaso!

- Verdes de pampa!

E os colorados vivos

do sangue em jorro das artérias jovens!

 

Recaiu o silêncio

misterioso e tenso

da campanha em guerra.

 

E na seguinte manhã clara, cedo,

a neta bonita de orvalhados olhos

e a avozinha murcha

com jeito e cuidado o acamaram na cova

feita ali mesmo onde caíra.

E por dar sombra ao peleador sangrado

lançaram na cova,

bem junto da cruz,

a raiz selvagem deste camboatan.

 

Hoje, nas manhãs esplendentes de setembro e de outubro

o vegetal renova!

Ondeia maretas de poncho nas ramagens.

E com os galhos mais robustos

ensaia gestos de quem rasga a armada

para – de todo o laço – um sobrelombo, lindo,

no horizonte arisco

que reluz ao largo.

 

Nos crepúsculos lentos dos verões de seca

ele vai se apagando ao longe, devagar e alto,

com a silhueta enorme

de um Folião ou de um Quebra!

De um Pedro Canga, um Guedes!

De um Juca Tigre ou de um Dom Segundo Sombra!

Ou de um Manuel Pedroso -  em frente ao Negro Adão!

 

Ah! Mas nas tardes trigueiras dos gelados invernos

emponchado em neblina, aos tombos com o minuano,

delira em duelo contra as ventanias.

Cada galho é uma espada contra o vento!

 

- Ele está “obecedado” com a alma do farrapo, aquele!

 

O que só contra muitos,

no desespero calmo para morrer como homem

sentiu, no lance trágico,

o redomão boleado...