RITUAL DE VOLTA

Ari Pinheiro

Quando eu voltar pra minha terra

Os campos estarão mais verdes

E estarão mais verdes

Porque na tela da minha retina

Ainda estará gravado

O mesmo frescor esmeralda

Que abandonei na partida...

 

Pelas minhas narinas

-Ávidas por brisas mansas-

entrarão os mesmo cheiros da infância...

Trevais, irapuás e lichiguanas

Alecrins, sempre-vivas e bibis

Numa profusão inebriante

De aromas e nostalgias...

 

Do labirinto escondido de meus ouvidos

Rebrotarão relinchos de baguais

Entre choques de guampas

No calarão dos rodeios!

Escarcéus e disparadas

Ao longo dos corredores!

 

Quando me apear na ultima porteira

Estas mãos sentirão calos antigos...

Que ficaram guardados

-Esperando este dia!

O tatear na tramela gasta

Selará por certo

O estranho ritual do reencontro!

 

Nesta mística eucaristia

Beberei o vinho alvo das cacimbas!

-E o pão da vida-

de araçás, pitangas e guabijus

Há de retesar meus nervos cansados...

E cada artéria renovada

Hei de galopar por estes braços

Como potrilhos em disparada

Nas crescentes de setembro!

Caramba! Quando eu voltar pra minha terra...!

 

Certamente os bolichos ainda estarão lá...

Porque alguém deve ter guardado

A cana pura

Da “caiana” que eu plantei quando piá!
e ao lado deste bolicho, o mesmo osso

Voando livre no espaço

Num grito de –“suerte”-

Há de voltar do passado

Para clovar- se aos meus pés!

 

Na velha cancha reta

As mesmas carreiras,

E pelo vão estreito do alambrado

Os mesmos gritos do guri campeiro...

-Olha o amendoim, rapadura, pastel...!

Na minha algibeira

A mesma mão de piazito pobre

Vai procurar o “cinco pila”

Que nunca esteve lá...

 

Entre a crina alçada dos fletes

Verei o tempo voltando, voltando e girando

Num sarandeio esquisito de poeira e mormaço!
-O cheiro doce da relva pisada

Despertará de repente do ventre da alma

Minhas velhas raízes campeiras!

 

Então hei de montar o meu petiço!

-Aquele que ainda deve estar me esperando!

E galoparei até o horizonte

Rompendo ventos e sesmarias

Ao som de velhos clarins campeiros

De minhas guerras de mentira

Para reencontrar minha infância

Que nunca pude esquecer

E então, então serei guri de novo

Antes de morrer!!!