LAGOA

Aparício Silva Rillo

 

I

As estrelas pediram,

pediram um espelho

pra Nosso Senhor.

 

O Senhor, surpreendido,

estranhando a pedido

chamou por Maria.

 

As estrelas pediram,

pediram um espelho

pra Virgem Maria.

Maria, tão boa!

Cortou do infinito um pedaço do céu,

de um pedaço de céu ela fez a lagoa.

 

Ficou um buraco no forro do céu,

chamando Maria, lhe disse o Senhor:

- Remenda o meu céu, que a idéia foi tua.

Maria, sorrindo, rasgou o seu manto

e pregou no infinito o remendo da lua.

 

II

 

Lagoa!

Sesmaria de águas claras

deitada nos pedregulhos.

Espelho grande onde as estrelas tolas

vem ajeitar o véu de lantejoulas

durante a longa procissão noturna.

 

Quando o sol da manhã tu te incendeias,

uma orgia de penas te enfeita as areias

e o silêncio se quebra a um concerto e pios.

A quietude das águas

nas praias mais rasas,

se encrespa de gozo ao buliço das asas

fazendo tremer os teus juncos esguios.

 

Gamela onde bebem, os bichos do campo

nas praias sombreadas por salsos-chorões.

 

Gamela de barro,

de pedra e areia,

tão cheia de água,

tão cheia de juncos,

tão cheia de flores

azuis de aguapés...

 

Lagoa noturna, salão das estrelas,

lagoa de luz, várzea grande de sol.

|lagoa dos salsos e das corticeiras,

lagoa onde mora

o martim-pescador.

 

Lagoa das lontras e das ariranhas,

lagoa dos peixes e dos jacarés

que brutos e rudes, armando carrancas,

espreitam as garças - tão tristes, tão brancas!

- que cismam em silêncio sobre os aguapés.

 

III

 

Lagoa do campo,

pedaço de céu!