REZA CHUCRA

Alcy Cheuiche

 

      Perdoe Virgem Maria

      Por lhe tomar atenção,

      Envolvendo um coração

      Tão puro e tão adorado,

      Nesta miséria qu'eu trago,

      Que arrasto, é melhor que diga,

      Por esta terra inimiga,

      Onde nunca fui amado.

 

      A Senhora bem se lembra

      Que nem sempre foi assim...

 

      Embora não fosse em mim

      Que a fortuna tinha ninho,

      Eu bem que tive carinho

      E uma mulher cuidadosa

      Que me deixava de jeito,

      Um lenço branco no peito,

      A bombacha bem limpinha,

      Quando para a igreja eu vinha,

      No tempo qu'eu fui feliz.

 

      Agora olhe pra mim.

      Veja esta roupa rasgada

      Qu'eu carrego com vergonha.

      Parece que a gente sonha,

      Quando vê que não é nada

      Prá dominar o seu vício

      Quando eu morava no pago

      As vezes tomava um trago

      No mais prá molhá a garganta

      E agora querida Santa,

      Até virei cachaceiro,

      Depois que bebo o primeiro

      Não há nada que me pare.

      E depois até que eu sare

      Vem me subindo a cabeça

      Toda essa vida passada

      E o rosto da minha amada

      Enxergo assim como em sonho...

 

      Ó minha Nossa Senhora,

      Escute ao menos agora

      Um pedido que le faço.

 

      Sei que a morte já me ronda

      Pela porteira do rancho...

      Até já vejo os caranchos

      Rodeando em volta de mim.

 

      Reconheço o meu pecado,

      E quando tiver chegado

      Lá na fronteira do céu

      Vão me apontar outro rumo:

      - Ovelha com mancha preta

      Bota a marca na paleta

      Que só serve prá o consumo. -

 

      Prá mim não há mais remédio,

      Não é prá mim o pedido.

      Sou índio chucro vencido

      Pelo vício aqui do povo.

 

      Eu peço é pelo meu filho,

      Que abandonei lá no pago

      Quando a sina de índio vago

      Me arrebatou da querência.

 

      Proteja a sua inocência...

      Não deixe que o coitadinho

      Siga este duro caminho

      Que está seguindo seu pai.

 

      Que fique por toda a vida

      Grudado naquele chão,

      Que resista a tentação

      Com toda a força de machd,

      Que não morra como guacho

      Quando pará o coração.