PATACOADA

Albeni Carmo de Oliveira

 

Já fui piazote metido

Fui alçado do rabicho;

Me criei pelos bolichos

Ouvindo e contando lorota.

E quando eu saía da grota

Disposto a fazer arruaça,

Sempre meia de cachaça

Ia no cano da bota.

 

E foi num fim-de-semana

Não me lembro bem o ano;

Que este gaudério e "andejano"

Se meteu numa enrascada,

Só por soltar patacoada

E querer bancar o alçado,

Quase que fico enterrado

No fundo de uma invernada...

 

Era sábado, escurecia

E eu piazito e pachola,

Para a vida não dava bola

E só queria gauderiar.

Em tudo eu ia me enfiar

Sem mesmo ser convidado;

E em bailes bem largados

É que eu gostava de dançar.

 

Preparei o meu cavalo

Pilchas, revólver e facão,

E saí pelo rincão

Procurando algum fandango.

Mas louco para passar o mango

Em algum coitado qualquer,

Que por ventura quisesse

Tirar penas deste frango.

 

Vejam só como é a vida

Quem procura sempre acha;

Ainda mais quando a cachaça

Faz parte do entrevero.

Pois eu achei um parceiro

E meti-me numa fria;

Mas aprendi naquele dia

A não ser mais patacoeiro.

 

Depois de bebermos juntos

Duas guampas bem lotadas

Saímos pela estrada

Com o sangue já bem quente;

Quando ouvimos pela frente

Ronco de gaita e violão

E um rancho de beira-chão

Atopetado de gente...

 

Para quem já vinha embalado

Aquilo era uma beleza,

Pois eu digo com certeza

Quem se criou lá p'ra fora,

Não esqueceu até agora

Nos bailes de chão batido.

Onde quem é exibido

Já entra arrastando a espora.

 

Combinamos de abusar

Deixamos os pingos pastando;

E para porta fui chegando

E já soltei a patacoada.

Perguntei: - quanto é a entrada

P'ra se dançar neste bochincho?

E já ouvi o cochicho

Na boca da mulherada!

 

O porteiro respondeu

Já comprando minha vasa:

"-Bochincho é na tua casa

Tu ta gambá, vai dormir,

Se não quiser engolir

Minha mão com dedo e tudo!"

E eu frangote e topetudo

Nunca pensei em sair.

 

Arranquei do meu facão

E gritei bem debochado:

-Me pula, me faz um costado,

E o índio se atracou;

A primeira ele errou

Mas na segunda me perdi,

E lhes juro que não vi

Quando a indiada nos cercou.

 

Lá fresca que tempo feio

Este que eu me meti.

Estava pior que bem-te-vi

Em dia de vento Norte,

Sentia chegar a morte

Pois já estava cansado,

Com o corpo ensangüentado

E não morri por pura sorte!

 

Mas quando vi uma brecha

E o parceiro que corria,

Pensei: - não é covardia,

Montei no pingo e parti.

O parceiro nunca mais vi

Dizem que ficou marcado

Mas hoje está velho e cansado;

Para os lados de Cacequi!...

 

Pois apanhamos daquela feita

Pior que porco roceiro;

E não te nego companheiro,

Me escapei foi por um triz.

Mas nunca mais meti o nariz

Aonde não sou chamado,

Deixei de ser um alçado

E hoje sou mais feliz.

 

Eu nunca mais me passei

Em bailes tomando trago.

Hoje eu só tomo um amargo

Com a china que me quer bem;

E até subir para o além

Recomendo à rapaziada:

-Trago, briga e patacoada

Não traz lucro p'ra ninguém!...